Divinas Tretas #42
Newsletter carioca sobre maternidade, mulheres e muito mais. Com dicas do peito para fazer com as crias e sem elas.
Queridas leitoras, Feliz Ano Novo!
Afinal de contas, o ano só começa depois do Carnaval, né? Esperamos que esse pequeno recesso de folia tenha trazido um pinguinho de felicidade em cada uma, no mínimo, porque descanso é difícil no mundo materno, não é mesmo?
Nesta edição, traremos textos e contos que esperamos que curtam tanto como nós: tem Chico (e não é o da Sonza) no texto e nas dicas, tem sorriso e a ausência dele, pais em aula de natação e home office.
Que tal fazer aquele comentário maroto para a gente saber o que você achou? Adoramos demais essa troca. Que tenhamos todas um 2024 revigorante!
A vida como numa canção do Chico
Não sei se já contei pra vocês, mas quando eu era criança e tava descobrindo as músicas de Chico Buarque minha mãe me confidenciou: “ele foi meu primeiro namorado”. Na minha inocência infantil, fazendo as contas de cabeça, seria super plausível que essa afirmação fosse fato, afinal os dois moravam na mesma cidade, fazia sentido pra mim. Anos mais tarde (tipo já quase adulta) que ela me desfez a ilusão: “namorado platônico, né, minha filha, quando que ele, famoso da zona sul, com 18 anos a mais que eu, iria namorar com essa insulana magrela?”
Causos à parte, a música desse gatinho (que quando eu adolesci já era um “gatoso” - gato-idoso - bem cinquentão) fez parte da minha formação como leitora de poesia. Tanto em casa como na escola destrinchei cada frase, cada soneto, cada rima rara de “Construção”, para perceber e tentar absorver essa forma de amar, de viver, de ver a cidade. Aprendi a me apaixonar através das letras dele (e de alguns outros cantores e cantoras da MPB, como já falei aqui e aqui).
Cresci, casei, sofri de amores (não necessariamente nessa mesma ordem) até que conheci meu maior amor, meu Tutuzinho. E naquele momento, com ele ainda na barriga, todas as canções de amor ganharam um novo significado.
Pra mim, Chico não falava mais de um amor romântico, mas sim do “maior do mundo”:
“Ah, se ao te conhecer
Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que 'inda posso ir
Se nós nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir”
Quando o poeta fala: “Fui assim levando e ele a me levar / E na sua meninice ele um dia me disse / Que chegava lá (...) Eu consolo ele, ele me consola / Boto ele no colo pra ele me ninar / Olha aí, Olha aí / Olha aí, ai é o meu guri” é do Tutu que ele tá falando. O meu gurizinho.
Quando ele diz que “Hoje você é quem manda / Falou, tá falado / Não tem discussão, não”, pra mim, diz dessa relação de mãe e filho, das necessidades urgentes e inadiáveis do bebê mas também da figura de autoridade em que a mãe se transforma. Mas mesmo assim, “Apesar de você / Amanhã há de ser / Outro dia”. Apesar de todos os perrengues dos primeiros anos, o outro dia chega. Apesar de todo o desconforto que é ser filho, apesar de todos os erros de quem nos criou, o outro dia chega.
E duvido encontrar maior definição da vida com um bebê do que essa: “Todo dia ela faz tudo sempre igual / Me sacode às seis horas da manhã (ou cinco, ou quatro e meia, depende de quando o sol raiar) / Me sorri um sorriso pontual / E me beija com a boca de hortelã (na verdade um bafinho de leite)”.
Chico não foi mãe, mas aqui, acredito na sensibilidade do poeta, que nos entendeu completamente:
“Todo dia eu só penso em poder parar
Meio-dia eu só penso em dizer não
Depois penso na vida pra levar
E me calo com a boca de feijão”
Só(RI)
Parei de sorrir a medida que envelheci. No outro dia percebi nas fotos que quase não sorrio mais. Sempre tive uma covinha e sorriso marcantes, mas agora eles não aparecem mais. Fiquei pensando porque minhas marcas registradas não tinham mais tanto registros. Por que meus lábios estavam quase sempre cerrados?
Passei a sorrir de boca fechada. Passei a sorrir de maneira comedida. Algo na minha cabeça passou a dizer que essa seria a maneira mais correta de aparecer.
Não sei bem ao certo dizer quando que parei de sorrir para as fotos, nem quando as minhas covinhas deixaram tanto de aparecer.
Já não sei se foi o tempo ou se foi o que ele (o tempo) fez acontecer. O tempo é assim mesmo. Ele vai passando e a gente não sabe se ele é sujeito ou predicado.
Noutra semana a terapeuta pediu pra acessar a memória de quando senti pela primeira vez um determinado sentimento. Não consegui. Assim como esse exercício, tentei acessar o momento que minha mente disse que era pra eu não sorrir mais, e também foi em vão.
De uma semana pra cá, depois dessa reflexão, tentei resgatar nas fotos o danado do sorriso e também não consegui. Talvez não é que ele não esteja mais lá, mas acho que ele deve tá meio ressentido de ter sido descartado. Como descartar uma marca registrada assim?
Adultos não deixam de sorrir. Mães também não. O que teria acontecido?
O fato é que nem da minha covinha eu lembrava até pensar em escrever esse texto, e nem sei mais se gosto do meu sorriso do mesmo jeito que gostava antes.
E desde quando a gente perde nossa marca? E será que realmente era uma marca?
Trabalho em casa
Eu adoro o home office. É meu sonho dourado que achava que simplesmente nunca viraria realidade. Lembro que antes da pandemia seguia um blog que chamava Nômades Digitais (eles falavam sobre trabalhar e viajar) e eu achava o máximo, ao mesmo tempo que via como um modelo de trabalho totalmente platônico pra minha realidade.
Daí veio a pandemia e da noite pro dia, todo mundo de home office. Na época eu tinha minha empresa e já ficava uns dias da semana em casa no modelo híbrido, que era o máximo que eu conseguia realizar. Porém, no começo da pandemia meu medo de viajar era tamanho que eu nem me liguei que também, do nada, meu sonho impossível tinha virado realidade.
Por ironia do destino, eu estava grávida e tive que fechar minha empresa, então praticamente não tive home office na pandemia. Por outra ironia, ano passado, quando o mundo estava pronto pra voltar pro presencial, eu consegui um trabalho 100% remoto. Trabalho esse que me faz entrar no Linkedin toda semana, e desde então, toda semana tem alguém por lá ou defendendo, ou condenando o modelo HO (home office paras os íntimos.)
Na semana passada um post me chamou a atenção e achei que valia trazer pra cá. No post, um senhor falando sobre os benefícios do trabalho em casa para as mães. E como ele possibilitou que mais mulheres alcançassem posições de lideranças. Sim, isso é ótimo. O post gerou um baita engajamento nos comentários, uma chuva de apoio e outra chuva de: por que só as mães?
Como se apenas as mães precisassem de mais tempo para aproveitar seus filhos, fazer comida pra eles, cuidar da casa e cuidar de si. Qualquer ser humano pode se beneficiar desse modelo de trabalho, todo mundo quer economizar tempo. Para algumas pessoas, ficar em casa com filhos pode ser um desafio maior do que sair de casa.
Claro que é um modelo melhor pra quem cuida de criança ou de idoso e isso precisa ser falado e aplaudido. Mas não podemos deixar de mencionar que essa responsabilidade de cuidar dos filhos ou dos idosos não deve ser só da mulher. Era só colocar esse pequeno (grande) adendo, homens falando sobre mulheres esquecem disso com alguma (grande) frequência.
No fim, nós mulheres, ficamos com o trabalho em casa e o trabalho da casa, ainda em 2024. Até quando teremos que escrever sobre isso? Será que em 20 anos vou ler esse texto e pensar: ufa não temos mais esse B.O. pra resolver. Espero que sim, sem muita esperança.
Sigo amando esse modelo remoto de trabalho e o defendendo, fico com raiva quando alguma notícia sobre o fim dele viraliza, como a Microsoft convocando seus executivos para voltarem pro presencial. O ideal seria mesmo cada um escolher o seu modelo favorito.
Enquanto a lógica do: manda quem pode, obedece quem tem juízo prevalecer. Seguiremos vítimas dos caprichos de uns poucos que não querem enxergar o corre de uns muitos.
Dia de natação
Todos já estão de roupa de banho e aguardam em torno da piscina a chegada da professora. Cada criança com seu respectivo adulto, o responsável da vez que pôde parar seus afazeres de gente grande para estar ali, numa aulinha de natação para alunos até 3 anos numa manhã de terça-feira. A mãe do Noah chega um pouco atrasada, sorrindo apressada para o porteiro da catraca, equilibrando o filho em um braço e bolsas no outro. Uma toalha pende de seu ombro, nas suas mãos estão as duas boias de braço e o cartão de controle do aluno.
Cumprimenta com cordialidade algumas mães e pais, embora por dentro só estivesse querendo chegar sem ser notada e fazer tudo o mais rápido possível se permitindo uma certa dose de mau humor. Coloca o filho no chão, termina de encher a segunda boia e tenta enfiar os bracinhos da criança dentro da circunferência, mas eles estão suados e aderem ao vinil, dificultando a colocação.
A professora chega dando bom dia a todos – “Bom dia, Noah!” - e a mãe aumenta seu nível de pressa, puxando a mão do filho com um pouco mais de força. Noah reclama. Mãe e filho prontos, boias meio tortas, todos entrando na piscina supostamente aquecida, mas que não estava lá muito confortável em termos de temperatura. A professora pede que façam uma roda e começa a cantar a musiquinha de bom dia.
Um bom dia
Um bom dia
Vamos dar
Vamos dar
Com muita alegria
Com muita alegria...
Todos os adultos ali já conhecem todo o protocolo e cantam em uníssono enquanto sorriem para os seus bebês - alguns deles felizes, outros com sono, outros irritados. Noah está fissurado na raia divisória flutuante e não presta muita atenção na musiquinha. A mãe tenta buscar seu olhar e engajá-lo na aula.
Todos os adultos ali jamais estariam nessa situação há poucos anos atrás, antes de terem filhos: numa piscina, com desconhecidos, cantando musiquinhas bobas enquanto sorriem sem parar.
Todos, no fundo de suas mentes ocupadas em parecerem bons pais, reparam no ridículo da situação, que só não chega a ser uma vergonha explícita por acordos não verbalizados de como se portar ali. Por exemplo, ninguém olha o outro adulto por muito tempo. Tá todo mundo em roupa de banho, né, às vezes num perrengue com o bebê, limpando um catarrão que saiu do nariz da criança, salvando de uma engolida de água, passando por um túnel de borracha na marra debaixo de choro, enfim. Pega mal. Encontros fortuitos de olhar são ok, mais do que isso já fica um pouco constrangedor. Algumas mães puxam papos sobre os filhos, daí desenvolvem um laço maior que lubrifica as relações.
A aula se desenvolve conforme a normalidade: crianças ora se divertindo, ora se esperneando, adultos cantando musiquinhas e cumprindo com as tarefas aquáticas numa incessante tentativa de trazer a atenção dos pequenos para o que deve ser feito. Um pai meio fortinho de corrente de prata no pescoço fala alto demais com seu bebê, numa tentativa disfarçada de chamar a atenção de algumas mães para si.
Uma mãe usa um boné do MST, enquanto um outro pai foi visto com camisa verde amarela antes de entrar na água. Tensões que não se estabelecem, visto que todos se evitam com cordialidade.
“Vamos dar tchau para a piscina!”, fala a professora, conduzindo para a musiquinha de tchau. Quase todos os bebês aderem, dando tchauzinho uns pros outros, provocando sorrisos orgulhosos dos seus responsáveis.
Fim da aula, todos saem da piscina. Toalhas, chinelos, roupões. Normalidade resgatada. Cada um segue o seu caminho e a vida continua para todos.
Dicas do Peito!
🐣 Com elas (as crias)
Chico para crianças
Da Ju
E já que falei do Chico, deixo aqui também a dica do espetáculo “Os Saltimbancos” pra ver ou ouvir com as crianças. Os Saltimbancos é uma peça de teatro musical infantil, inspirada no conto "Os Músicos de Bremen", dos irmãos Grimm. Na peça original, em italiano, as canções têm letra de Sergio Bardotti e música de Luis Enríquez Bacalov. A versão em português ganhou canções adicionais, de Chico Buarque. Também tem no Spotify.
Expo Mundo Zira no CCBB
Da Dani
Em março, no CCBB, terá a EXPOSIÇÃO MUNDO ZIRA, que é uma grande exposição sobre o Ziraldo.
Meus filhos não conhecem bem, mas é a oportunidade de me conectar a minha menina maluquinha!
Mais informações em: https://www.instagram.com/mundozira
Argilinha
Da Catarina
Comprei no carnaval (aqui) mas tem em todo lugar. Apesar da bagunça, foi um sucesso só. Tentamos deixar secar pra pintar depois, deu certo em partes porque a novidade rendeu boas horas de distração (no máximo 20 min) e no final ficamos com um pedaço de barro duro, pintado à mão.
💃 Sem elas (as crias)
This is Chico
Da Ju
Eu sou do tipo de ouvinte que gosta de escutar o álbum inteiro, de cabo a rabo, assim como toda a discografia numa tarde, até esgotar minha “sede” daquele artista. No caso do texto de hoje, essa foi a trilha que me inspirou e embalou (e acho que vai embalar os próximos dias, é uma delícia).
KING KONG FRAN
Da Dani
Espetáculo sensacional da Rafaela Azevedo, fala sobre machismo e as milhões de violências que sofremos diariamente ao longo dos milhares de anos.
Muito divertido e com tiradas sensacionais, vale muito a pena assistir!
Terá mais três apresentações no RJ no começo de março.
Duas séries
Da Catarina
Assisti Sr e Sra Smith na Amazon Prime e curti bastante. O final me decepcionou um pouco, mas a série em si tá muito boa. Achei que ia achar chato porque já conhecia a história, porém Donald Glover tá arrasando muito. E tem também Wagner Moura mandando super bem. A produção tem um nível altíssimo e a história tem aquela misturinha boa de ação com romance.
The New Look, essa séria ainda tá rolando, mas já quero indicar. Baseada em fatos reais conta o que aconteceu com Dior, Chanel e outros da alta costura durante e depois da invasão nazista. Uma mega produção e uma história super interessante. Tô amando. Na Apple Tv.
🎶 Já conhece as nossas playlist no spotify?
→ Para ouvir sem as crias
→ Para ouvir com as crias
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Raras vezes depois de parida consigo ouvir "meu guri" sem chorar. Chico é demais mesmo Ju (seu padrasto platônico rsrs)
e lá vou eu de novo assinar a apple tv só pra ver The New look hehehehe amo uma produção que envolve moda e história