Divinas Tretas #61
A treta da saudade da gente, de criar mais de um filho, de adolescer junto e do adulto premium.
Olá Divinas,
Expectativa é uma coisa doida, né? E aqui no nosso grupo de escritoras temos duas grávidas, mulheres em expectativa, como diriam os ingleses. E nós, adultas não-grávidas seguimos cheias de expectativas de dar conta de tudo e saber se virar sempre. A news de hoje tá assim, cheia de expectativas de quem somos, quem seremos, quem devemos ser. Crie suas expectativas e veja se elas foram correspondidas!
Saudade de quem já passou
Minha filha mais velha falou que meu sovaco tá ficando fofinho, ou seja, a gravidez chegou até ele. E essa fala dela despertou uma enorme saudade de mim mesma. Não tem “gratiluz” no mundo que acalme a minha vontade de dormir um dia inteiro, tomar um litro de café, beber mais que uma taça de vinho, me empanturrar de comida japonesa, sorvete e chocolate. São tantas as limitações impostas pela gestação que a gente mal consegue listar tudo, até porque falta de memória é uma delas.
Sinto falta de fazer todos os exercícios do funcional sem precisar pegar leve, de fechar o zíper e o botão das calças, de pegar minha filha no colo sem me preocupar em levar um chute na barriga e de pular do trampolim. Sinto falta de pular, no pula-pula, do barco, de sentir o vento no rosto e o frio na barriga.
Eu queria deitar de bruços, queria parar de ver vídeo de grávida, enxoval e achadinhos da Shopee... Pra qualquer coisa que você digita no Google e coloca gravidez no final, vai ter alguém falando que aquilo não é bom pra grávida. A grávida é aquele monólogo do filme da Barbie multiplicado por mil. Não pode nada em excesso e nada que é bom. E qualquer perebinha que apareça no seu corpo pode ser da gravidez e pode não ser. Gestar é lindo, mas é chato pra ca...
Sigo estudando, e a exaustão mental desse trabalho solitário também me faz ter saudades de trabalhar de verdade, de jogar conversa fora, de pensar em um projeto que não seja passar, da simplicidade do salário caindo na conta.
Meus sentimentos já estão entrando naquela área nebulosa do puerpério. Quase posso ver cada um se preparando pra enfrentar o que virá. A alegria levando coberta porque sabe que pra ela será frio, a tristeza usando só paetê, pois será a sua hora de brilhar. A ansiedade escolhendo eternamente o que levar.
Nesse oitavo mês de gestação, a minha meia de compressão virou minha melhor amiga. Reter líquido certamente é uma das piores coisas dessa fase. Eu penso no baiacu que vive inchando no mar, me sinto um quando me olho no espelho. O bom é que pra ele desinchar é só se acalmar; pra mim, o tempo precisa passar, o parto acontecer, mais um tempo passar e, aí sim, começo a voltar pra minha forma anterior ou pra uma forma parecida com aquela que já tive.
Hoje acordei com uma leve dor de garganta e lembrei também do tempo em que podia tomar remédios sem consultar ninguém. Não deveria, mas faço. Ser irresponsável com o próprio corpo ou a própria vida é um luxo que a gente nem sabe que tem, até perder. Se eu fosse youtuber, faria um vídeo assim: top 5 coisas que sinto falta na gravidez, e aí, quando você clica nele, eu fico falando por mais de uma hora e ele já foi editado e atualizado diversas vezes. Porque isso muda toda hora, todo dia.
Apesar de tudo isso, eu sei: a saudade passa, ela se transforma, e a minha outra versão está me esperando ali na esquina do tempo com a liberdade, logo após a ponte da autonomia que eu e a minha bebê vamos atravessar.
A mesma praça, o mesmo banco
Continuando a série de “frases feitas da sociedade sobre criação de filhos”:
Dia desses conversava com um homem gay sem filhos sobre como eu agora ia ter, segundo ele, a oportunidade de vivenciar de novo essa jornada e ver “como pode, né? dois filhos criados pelo mesmo pai e pela mesma mãe e que são tão diferentes”.
Não, meus filhos não vão ser criados pelos mesmos pais.
Cada filho vai vir de um jeito, cada pessoa vai ser única, independente de quem faça parte da família. Não é porque os genitores/cuidadores são em teoria os mesmos que a combinação genética vai ser a mesma e que, ainda que fosse, isso determinaria o repeteco da personalidade. Nem gêmeos idênticos são cópias comportamentais um do outro, que dirá irmãos de “barrigas” diferentes.
Yotra, um filho nunca vai ter o mesmo pai e mesma mãe que o outro. Acho que isso é o que mais me irrita nessa frase, pois ignora o tanto de transformação que é possível de acontecer a um pai/mãe a cada criança que chega.
De novo, meus filhos não vão ser criados pelos mesmos pais.
Que bom e que ruim, a depender da lente que a gente colocar.
Que ruim pro segundinho, que provavelmente vai receber pais com menos disposição e mais dores nas costas pra aguentar o tranco físico dos primeiros anos. Coitadinho dele, que já vai nascer tendo que dividir a atenção com uma outra criança, o tempo dos pais e o emocional cansado deles. O minino que dificilmente vai ganhar coisas novas, quase todo o enxoval tá sendo de segunda mão (ou terceira, quarta) e vai continuar assim, herdando itens que já foram do irmão pros primos e agora estão voltando.
Que bom que não vai receber a mesma mãe controladora e ansiosa com que o irmão teve que moldar, essa mãe que demorou bons anos de terapia pra chegar no ponto mais tranquilo que chegou. Que maravilha que seu pai desenvolveu as habilidades necessárias de cuidar do seu bem estar físico e emocional e já criou seu próprio repertório de cuidado e presença. O tesouro que será ter um irmão mais velho que já sabe de todas as coisas mais legais do mundo, que recebeu uma educação emocional tão legal e que vai certamente passar isso pra frente. A maravilha de fazer parte de um grupo de famílias que não é perfeito mas que vê nisso a verdadeira riqueza, o tanto de tios e tias e amiguinhos com braços abertos pra recebê-lo.
Mais uma vez, meus filhos não vão ser criados pelos mesmos pais.
Pode até ser a mesma praça e um banco parecido, mas as flores e o jardim já são outros.

Querida filha,
Certamente você acompanhou, nas últimas semanas, o estardalhaço que uma série da Netflix sobre adolescência causou em todas as redes sociais.
Pois é... Nessa mesma semana, ouvi um podcast com uma juíza da Vara da Infância do Rio de Janeiro (episódio do “Fio da Meada”)
e fiquei muito pensativa sobre esse período que você está passando – e que, por assim dizer, nós estamos passando.
Preciso te dizer que sei o quanto esse é um período muito, muito cruel na nossa vida. Um momento em que a gente não cabe nas roupas, não cabe nos espaços, não cabe na família, não cabe, às vezes, nem nos nossos amigos ou nos nossos próprios pensamentos.
Pra ser bem sincera, eu não lembro totalmente de como eu era nessa idade, mas lembro dessa sensação de achar tudo meio sem sentido, de me achar horrível, de achar todo mundo chato demais.
E, do outro lado, como mãe de uma adolescente, quero te dizer que, sim, as coisas também estão meio sem "cabimento" pra mim. Preciso admitir que muitas vezes eu não sei o que estou fazendo. Mesmo tendo várias convicções, mesmo tendo lido um monte de coisas, eu me sinto totalmente loser.
Tenho total noção de que aquela menina que era minha companheirinha de cozinha, de teatros, de mil atividades durante a semana, que eu vestia como se fosse uma boneca fashion... não existe mais.
Não sei o que você gosta de vestir, o que você ouve, o que você assiste. Na verdade, às vezes, parece que eu não sei nadinha de você.
Ouvir aquele podcast e ver a série foi a confirmação de que nós, pais, não sabemos nada de vocês — especialmente neste mundo onde tudo muda tão rápido, onde as pessoas são criadas por inteligência artificial e vocês têm acesso a informações de maneira tão intensa e, muitas vezes, devastadora.
O que eu queria mesmo dizer é que, de certa forma, mesmo quando não parece, eu te entendo.
Que muitas vezes eu realmente não sei o que estou fazendo. Mas que, acima de tudo, eu me preocupo muito com você, que eu te amo, e que, mesmo quando não parece, eu quero o seu bem.
Quero dizer que sei que você não é mais minha bonequinha fashion. Que eu também cometo minhas mancadas como mãe de adolescente. Que muitas vezes estou perdida. Mas juro que estou tentando.
Não desejo só que você seja bem-sucedida, que passe de ano ou que pare de querer se isolar nas redes sociais. Eu desejo, de verdade, que você tenha em mim alguém que te ama, que se preocupa e que quer te ver feliz.
Que a nossa adolescência (porque ela também é minha) — por mais dolorosa e cruel que seja — possa ser também um tempo de descobertas incríveis e de construção de caminhos verdadeiros.
Eu te amo, minha adolescente.
Adulto Premium
Numa conversa com amigos homens sem filhos - sim, incrivelmente tenho esses espécimes de ser humano preenchendo essa cota na minha vida, e são legais, juro - um deles citou que, apesar de ser adulto, para algumas coisas precisava recorrer à ajuda de um adulto premium. Foi aí que entrei em contato com esse conceito que depois vi em memes e entendi que existe para além daquela mesa de bar.
Um adulto premium seria essa pessoa para quem você escreve quando não sabe algo básico do dia-a-dia de alguém que teoricamente é capaz de gerir sua própria vida.
A minha descarga disparou, que tipo de profissional aciono? Perdi meu paladar, que especialidade médica cobre essa questão? Preciso resolver uma determinada burocracia, será que ela é jurisprudência do cartório ou de qual outro órgão público? Preciso de um dentista que faça canal, quem poderia me dar? Coisas assim.
Desde então me pego pensando nessas lacunas que levamos conosco. Seriam elas frutos de uma infância sem muito estímulo a autonomia? Seriam algum grau de TDAH? Uma inabilidade, alguma característica que não foi desenvolvida ao longo da vida? Nos homens, muitas vezes credito essas lacunas ao patriarcado. Nas pessoas que tiveram muitos funcionários para tudo, credito a uma questão de classe. No fim, acabo constatando que a maior parte dessas lacunas existe porque é impossível saber tudo e dar conta de tudo.
Assim como não conseguimos concatenar em uma mente de um indivíduo todo o conhecimento do mundo e por isso, como espécie, criamos formas de nos dividir e nos especializar - você, boa em matemática, vai melhorar os conhecimentos mundiais das exatas; você, boa de contar histórias, vai pra humanas, etc etc - agora percebemos que não conseguimos concatenar em apenas um adulto todas as responsabilidades que os adultos têm. Minha teoria é que na infância a gente acredita que os adultos sabem tudo, dominam tudo e são plenamente confiáveis nos assuntos de gerir a vida. Então a gente finalmente vira adulto e se depara com a realidade que não sabemos muitas coisas, que tomamos muitas decisões sem 100% de certeza. Passamos a achar que o defeito é nosso, que falhamos em esquecer algumas coisas que são tão obvias, ou não dar conta de outras que todo mundo parece tirar de letra.
Mas na verdade ninguém é totalmente premium o tempo todo. Para uns tópicos, certamente sou adulto premium para meus amigos, para outros, sou adulto basic e preciso de ajuda. E chamar os universitários aqui - ou a ajuda especializada caso você não tenha a cultura pop anos 90 da TV brasileira e não saiba o que significa “chamar os universitários”- é recorrer aos amigos mesmo. Grupos de amigos no whatsapp são entidades adulto premium: se você não sabe, alguém sabe. Outro dia será a sua vez de ser a que sabe. Rede de apoio cotidiana, que pode ser que não vá até sua casa consertar um eletrodoméstico, mas conhece um técnico mara, ou tem uma dica infalível de resetar configurações, ou sabe onde acha o manual em pdf. Se tem algo que todo adulto deveria saber é pedir ajuda e criar sua própria rede premium.
😉 Dicas do Peito!
Um planetário na palma da mão
Da Ju
O Tutu veio da escola falando que o prof de Ciências tinha apresentado esse app pra eles e eu PRE-CI-SA-VA baixar no meu celular. É o Stellarium, que usa a geolocalização para permitir a visualização do céu e da posição dos astros. Também permite criar favoritos, ler informações e muitas outras funcionalidades. Eu achei o máximo! Tô doida pra testar na roça ou na praia onde a luminosidade da cidade não atrapalhe tanto.Quebrando o paywall
Da Ju
Sabe quando você quer abrir uma notícia do site do jornal mas ela exige o login ou assinatura? Tem um jeito de burlar essa barreira, chamada de paywall. Basta colocar antes da URL do site essa aqui:https://12ft.io/
(precisa colocar o / no final pra separar do https:// do site que você quer abrir).
Já sei disso há um tempinho, mas percebi essa semana que muita gente ainda não, a Marcela era uma delas, então fica a diquinha.Massa Chiclete
Da Catarina
Essa massinha tem sido uma salvação em situações tipo esperar a comida chegar no restaurante, não é nenhuma novidade. Mas achei mais prático andar com esse potinho do que levar outras distrações, tipo papel e lápis pra desenhar. A textura dela é diferente das outras massinhas, então por hora ainda não virou um bolão cinza e também não fica seca com tanta facilidade.
Meia de compressão
Da Catarina
Se você tá grávida ou tem problema de circulação, vale considerar usar uma. Esse modelo é mais prático e fácil de colocar, eu amo, ela não resolve a vida, mas pra mim já dá uma boa aliviada naquela sensação de baiacu rsrs. Ela tem cano curto e é aberta nos dedos, facilita pra usar com chinelo.
Cem anos de solidão
da Dani
A série da Netflix baseada no livro do Gabriel Garcia Marquez é densa, complexa, mas traz muitos questionamentos interessantes sobre família, ancestralidade e política. A fotografia é linda, os cenários também, e a série me prendeu de uma maneira absurda durante a semana passada.
Episódio da Rádio Novelo
Por Marcela
Recomendo ouvir esse episódio do recém inaugurado podcast "escute as mais velhas", que é inspirado no Wiser Than Me e que entrevista mulheres idosas e maravilhosas que são importantes para o feminismo no Brasil. A Heloisa faleceu há alguns dias e ouvi-la assim, tão presente, foi emocionante. Principalmente no final, que ela fala da velhice e de como ela vê os próximos passos do feminismo. Esse lance de envelhecer me pega muito, já escrevi sobre isso na minha outra newsletter aqui e outras vezes. Isso de se ver no fim da vida, mas se manter se atualizando e dialogando mesmo sabendo que em breve vai deixar de acompanhar os rumos da humanidade, ao invés de se fechando numa geração que já passou, é lindo demais.
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